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Vamos falar sobre suicídio?

  • 8 de mai. de 2024
  • 6 min de leitura

A valorização da vida como enfrentamento ao sofrimento


Você já teve um dia muito triste na sua vida? Ou quem sabe passou por uma fase complicada, enfrentando alguns problemas sérios, questões de saúde, desentendimentos, coração partido, desilusão ou solidão? Acredito que sua resposta será um sonoro “Sim!”. E é normal que seja… Em algumas dessas situações você já pensou que seria melhor “se tudo acabasse de uma vez?” É provável que sim, também. No entanto, há uma diferença e complexidade muito grande em desejar que tudo se acabe de uma vez, a qualquer custo, e chegar ao ponto de fazer algo que leve ao fim de tudo. Sim, vamos falar sobre o “dar fim a tudo”, o suicídio. 


É natural que todas as pessoas enfrentam problemas na vida, alguns com maior ou menor dificuldade, com soluções fáceis ou não. É natural também que tenhamos algumas crises existenciais, em que tentamos encontrar sentido e propósito no que estamos fazendo com a própria vida, em que questionamos nossas decisões, nossos desejos e nosso lugar no mundo. Problemas, dificuldades e sofrimentos são inevitáveis. E é normal que as pessoas sofram de alguma forma diante dos problemas que enfrentam e dos sofrimentos que as atingem. Ficamos, por vezes, inquietos e ansiosos na expectativa de que as turbulências da vida passem rápido e que as dificuldades cessem para que possamos viver com felicidade, mas é preciso ter certa naturalidade ao lidar com tudo isso. Afinal, faz parte da vida.


Entretanto, uma forma nada saudável de lidar com as angústias de vida é o suicídio. E é extremamente necessário que falemos dele e o compreendamos, tanto para ajudar pessoas em situação de sofrimento e quanto para não ter uma visão equivocada sobre ele. 


Certamente muita gente já ouviu alguém dizer que o suicídio “é falta de Deus”, “é frescura”, “mimimi”, “obra do diabo” e outras coisas nesse sentido. Não! O suicídio não é isso. O suicídio é, na maioria das vezes, o desfecho trágico de um longo e sofrido processo anterior que o sujeito tem passado. O suicídio é visto por muitas pessoas como o último recurso para lidar com alguma situação de extrema angústia e sofrimento, na qual a pessoa fica “num beco sem saída” e acredita que só a morte pode ser a saída. 


A verdade é que no Brasil o suicídio é a terceira causa de morte por fatores externos - aqueles que não estão associados a doenças no organismo, por exemplo. Entretanto, há a subnotificação dos casos no país, o que dificulta o registro de dados reais e a criação de práticas de enfrentamento e apoio à população por meio de políticas públicas. Por outro lado, há um grande risco quando as pessoas fazem “alarde” diante de um caso de suicídio, e até mesmo dão um aspecto sensacionalista ao acontecimento, desrespeitando tanto a memória do sujeito quanto de sua família e entes queridos. 


Um efeito secundário do suicídio de alguém é o fato de que outras pessoas que possam estar passando por sofrimento grave encontrem inspiração naquele que realizou o suicídio e acaba “tomando coragem” - como se diz - de dar fim à própria vida. 


Como nós sabemos, as formas em que o suicídio acontece são diversas. Os dados mostram que homens realizam suicídio até quatro vezes mais que mulheres e faixa etária em que mais ocorre é após os 25 anos de idade, sendo que nos últimos anos tem crescido consideravelmente os casos de suicídio em pessoas com mais de 60 anos no Brasil. É uma realidade deveras preocupante. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, 78% dos suicídios no mundo ocorrem em países de média e baixa renda e o número total de suicídios por ano no planeta é em torno de 800 mil. 


Os fatores de risco que levam alguém a realizar o suicídio são diversos, mas eles não acontecem sozinhos. Alguns desses fatores são: desemprego, desesperança em relação à vida, perdas de pessoas queridas, de bens materiais e situações positivas, tensões na vida, como rompimentos amorosos, problemas com a justiça, falta de aceitação social, preconceitos, doenças mentais, depressão, esquizofrenia, distúrbios mentais, problemas de saúde graves, traumas, abuso infantil, maus-tratos, solidão, isolamento, desastres, crises existenciais, dentre outras. São vários os fatores, e eles precisam ser considerados. 


A vida não é simples, nós sabemos disso. Um único fator não é determinante nos acontecimentos complexos da existência. O mesmo acontece com o suicídio. É inocente e insensato dizer que uma pessoa realizou suicídio por isso ou por aquilo, especificamente. Um ato como esse não costuma ser feito de um dia para o outro. A pessoa costuma iniciar com alguns sentimentos de desesperança e mal-estar mental, pode apresentar sintomas depressivos, insônia ou sonolência exagerada, isolamento social, e em seguida sente-se impotente diante das circunstâncias da vida, chegando a acreditar que a morte é o único meio de ficar livre do sofrimento que enfrenta. O suicida costuma se planejar, dá alguns sinais de que não está bem, às vezes deixa alguma carta ou um indício maior a respeito dos fatores que o motivaram ao realizar o ato. 


Entre o pensamento de morrer e a passagem ao ato do suicídio há um certo caminho que o sujeito percorre. E é nesse período em que se faz importante o apoio social, o cuidado da família e da comunidade, o suporte emocional e a realização de iniciativas para ajudar o sujeito a enfrentar a situação difícil pela qual ele passa. É importante ter a sensibilidade de detectar alguns sinais no comportamento e na fala do sujeito, alterações no seu humor, mudanças na sua forma de se relacionar com as pessoas, na aceitação de si mesmo e no cuidado com a própria saúde. 


Várias coisas servem como fatores de proteção para a pessoa com sofrimento. E, felizmente, elas são várias. Estar empregado é uma delas, pois o trabalho ocupa um importante papel na vida e na rotina de alguém. Ele dá propósito, embora em situações adversas ele possa ser um fator de risco. Ter criança em casa é outro importante fator protetivo, pois crianças costumam gerar alegria no ambiente, desperta comportamentos de cuidado e serve como companhia. Elas também costumam servir como um motivo de esperança. Afinal, crianças são a continuidade da família e do ciclo da vida. Com elas alimentamos a esperança de dias melhores. Ter um animal de estimação também é um importante fator. Um cãozinho fiel e feliz muda o humor da gente. Tê-los em casa é um ótimo elemento.


Além disso, possuir laços sociais fortes é de grande importância: ter alguém a quem amar, família, amigos e colegas fortalece nosso sentimento de pertencimento, faz-nos sentir incluídos e queridos por alguém. Sendo a solidão um fator de risco, a presença de outras pessoas ajuda a lidar melhor com as adversidades da vida. Por isso, laços comunitários, religiosos e sociais ajudam a proteger as pessoas do suicídio. Praticar esportes também ajuda muito. Em primeiro lugar porque o exercício físico revigora o corpo e libera neurotransmissores que atuam no cérebro e geram sensações positivas. Em segundo lugar, praticar esportes quase sempre envolve a presença de outras pessoas. Além de cuidar do corpo, os laços sociais também são fortalecidos no processo. 


Todo tipo de autocuidado é fator protetivo em relação ao suicídio. Manter autoestima, senso de humor, autoconhecimento, capacidade de procurar ajuda e disponibilidade para ser ajudado são de extrema importância. Afinal, é importante cuidar de si mesmo. Entretanto, se o sujeito está em algum processo depressivo, essas ações são menos fáceis, pois é mais comum haverem pensamentos de autodepreciação. Contudo, o auxílio de medicamentos certos e de pessoas dispostas a fortalecer o cuidado podem minimizar os efeitos da depressão.


Existem muitas formas de ajudar uma pessoa em sofrimento. A principal delas é acolher, escutar e respeitar o sofrimento do outro. Em suma, ter empatia. Uma boa conversa ajuda muito uma pessoa que pensa em realizar um suicídio. Os serviços públicos de saúde mental podem e devem ser procurados para auxiliar o sujeito nesse processo, oferecendo atendimento profissional a quem necessita. Fazer acompanhamento com médico, psiquiatra e psicólogo é de suma importância. Os medicamentos também são de grande ajuda para fortalecer as estratégias de enfrentamento da pessoa em sofrimento. Existe também o Centro de Valorização da Vida - CVV - que presta serviço de escuta gratuita para pessoas com pensamentos suicidas ou que estejam enfrentando qualquer tipo de dificuldade existencial. Basta ligar gratuitamente no 188. 


Embora a vida possua muitos percalços, ela não precisa ser difícil a ponto de levar alguém ao extremo do autoextermínio. Enquanto sociedade nós temos o dever moral de fortalecer e amparar as pessoas. Valorizar a vida e a dignidade humana é fundamental para auxiliar as pessoas em sofrimento. Se a vida não é um mar de rosas, não precisa ser um mar de espinhos. 


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